Criado em agosto de 2008, esse fundo recebe doações com as quais deveriam ser financiados projetos de preservação da Amazônia.
Dois desses doadores são Estados estrangeiros, Alemanha e Noruega, o que constitui um óbvio atentado à noção de que a conservação do bioma amazônico, ou de qualquer outra parte do território nacional, é um assunto que diz respeito exclusivamente aos brasileiros.
Não bastasse isso, o fundo parece fadado a seguir o padrão de incompetência gerencial do governo petista, pois apenas 11,4% do R$ 1,29 bilhão doado foi efetivamente usado. Gomo o prazo estipulado para a utilização dos recursos acaba em dezembro de 2015, o governo corre para negociar mais tempo.
O vexame é, portanto, completo.
A existência do Fundo Amazônia já é, em si, uma contradição.
Houve um tempo em que os líderes petistas eram os campeões da defesa da soberania nacional sobre a Amazônia, enxergando em todo canto conspirações "imperialistas" para tomar dos brasileiros o seu patrimônio natural.
Em 2006, dois anos antes que o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinasse o decreto que criou o fundo, o chanceler Celso Amorim bradou que "a Amazônia é patrimônio do povo brasileiro e não está à venda", referindo-se aos "interesses de pessoas, entidades ou mesmo governos estrangeiros com relação à Região Amazônica", preocupados com o fenômeno da mudança climática.
Embora, eivada de entusiasmo militante, mais apropriado para uma assembleia de estudantes do que para uma manifestação do chefe da diplomacia, a declaração de Amorim foi na direção certa ao enfatizar que a Amazônia é problema dos brasileiros, e de mais ninguém.
O estabelecimento do Fundo Amazônia, porém, foi uma admissão franca de que o Estado, sob a administração petista, era incapaz de cumprir suas obrigações na preservação daquele bioma sem recorrer à ajuda, jamais desinteressada, de governos estrangeiros.
Como um país como o Brasil, cuja economia está entre as maiores do mundo, aceita recorrer à ajuda internacional para amealhar os recursos necessários para cuidar de uma parte de seu território?
Os recursos captados pelo fundo estão condicionados à redução da emissão de gases de efeito estufa que resultam do desmatamento.
O problema é que os alertas de desmatamento na Amazônia Legal cresceram 26% entre agosto de 2012 e fevereiro deste ano, o que gera "incômodo e desgaste do Brasil no cenário internacional", conforme salientou Adriana Ramos, integrante do Comitê Orientador do Fundo Amazônia, Para ela, "a imagem que fica é ruim",
Como o País aceitou recursos estrangeiros não reembolsáveis, também deve prestar contas do uso. desse dinheiro, expondo-se ainda mais à censura internacional num assunto que deveria se circunscrever, por óbvio, apenas ao Brasil.
O governo da Noruega, por exemplo, considera que os projetos aprovados até agora não refletem o volume de recursos. Diplomaticamente, disse acreditar que haverá maior celeridade daqui para a frente.
Trata-se de uma situação esdrúxula, em que o governo brasileiro deu a um governo estrangeiro o direito de opinar sobre o andamento de iniciativas para a preservação da Amazônia.
Noves fora o evidente comprometimento da soberania nacional, a Noruega tem razão. Mesmo com mais de R$ 1 bilhão à disposição, o governo simplesmente não consegue realizar os investimentos necessários para frear o desmatamento sistemático da Amazônia.
Como já se tornou habitual em quase todos os quadrantes da administração pública federal, o gigantismo burocrático e a ausência de planejamento retardam ou inviabilizam as soluções dessa grave questão ambiental, dando margem a que estrangeiros se sintam à vontade para palpitar sobre a administração da Amazônia e, por tabela, para tratar dela como se fosse território internacional
O Estado de S. Paulo
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