A pergunta padrão do momento nos gabinetes do poder reproduz a questão em alta no mercado financeiro e a dúvida em voga entre os empresários:
Antonio Palocci, ministro-chefe da Casa Civil da Presidência, fiador do governo Dilma para boa parte desse público neoperplexo, ponte confiável para a ampla aliança partidária no trânsito entre o Legislativo e o Executivo, fica ou sai do governo?
Desprezemos o testemunho dos que garantem que ele não sairá porque não há substitutos.
Bobagem, sempre os há.
E os nomes mais óbvios já estão há muito declamados por petistas:
Paulo Bernardo,
Fernando Pimentel,
Jaques Wagner,
Luciano Coutinho (com reforço na coordenação política),
Alexandre Padilha, empresário gaúcho amigo (com outra vocação ao posto), o ex-presidente Lula (numa troca possível mas pouco provável de papéis), enfim, um mundo de possibilidades.
Tantas, e nenhuma, por enquanto, pois a presidente ainda está naquela fase de esperar que uma solução caia dos céus.
A questão a que se deve dar sentido é se haverá alguma diferença em ter ou não Palocci no governo.
A resposta, por enquanto, é também não.
Enfraquecido e sofrendo a desconfiança generalizada de que há algo por trás dessa fumaça que lhe cobre o rosto e que ele teima em não dissipar, já está.
A descoberta sobre os valores que o ministro acha ou não importante preservar abalou também o conjunto do governo, levando à vertigem a própria presidente.
A intervenção de Lula em dois Poderes de uma só vez, o Executivo e o Legislativo, desequilibrou ainda mais a presidente e mostrou que, se já volta agora às rédeas do poder, mais ainda daqui a três anos e sete meses, o que cristaliza a tese de que o atual é mesmo um mandato tampão.
Independe da sorte de Palocci, porém, a constatação de que o governo Dilma foi mal construído e funciona precariamente, a mudança exige mais que a troca de uma peça.
Até mesmo em comparação com o governo Lula, e fiquemos apenas nesse, da mesma estirpe, do qual foi parte importante.
O ex-presidente Lula nomeou líderes fortes, cada um com sua vocação e instrumentos, para ajudá-lo na política.
Não significa que tenha feito um bom governo. Sem juízo de valor, armou-se das chances políticas.
José Dirceu, na Casa Civil, fazia a coordenação política maior, tendo como tinha o controle do PT e o acesso privilegiado ao PMDB, o maior partido do Congresso que levou para perto do governo.
Luiz Gushiken teve a missão de ser um ministro forte e poderoso para atuar na forte e poderosa área de Comunicação. Gilberto Carvalho foi a ponte com a Igreja, os movimentos sociais e sindicatos.
Na liderança da política econômica, Lula colocou Antonio Palocci, já apoiado pelo mercado e empresários aos primeiros acordes da campanha eleitoral, desde a Carta aos Brasileiros que amarrou o compromisso do petismo com a estabilização.
Márcio Thomaz Bastos, da Justiça, atuou mais na articulação política que qualquer coordenador formal, e deu sustentação jurídica a todo o governo.
Nelson Jobim levou para Lula as vantagens do seu acesso ao Supremo Tribunal Federal e garantiu-lhe uma tranquilidade ímpar no seu relacionamento com os militares.
Jobim implantou para valer o Ministério da Defesa.
A coordenação política formal foi exercida por sucessivos políticos de peso, de Aldo Rebelo, ex-presidente da Câmara, aos jeitosos mineiro Walfrido dos Mares Guia e o baiano Jaques Wagner.
No fim, quando o governo Lula já estava desfigurado e restavam em cena o presidente e sua voz, a tarefa da política foi entregue a Alexandre Padilha, um médico neófito no exercício do poder que fez um varejo bem sucedido na articulação com o Congresso.
No governo Dilma Rousseff não há esse tipo de peças no jogo.
José Eduardo Cardoso, ministro da Justiça, está realizando um trabalho interno de gestão, mais afeito à tarefa de secretário-executivo.
Alexandre Padilha ficou com a área da Saúde, missão acachapante que não permite desvio do foco.
A articulação formal com o Congresso foi entregue a um deputado do PT sem maior expressão ou acesso aos partidos, Luiz Sérgio.
Fernando Pimentel assumiu como ministro forte o Desenvolvimento. Amigo da presidente, acesso total à política, mas em litígio com seu partido, o PT, em Minas, optou pela discrição.
Em três áreas importantes a presidente teve que engolir ministros impostos, e em duas delas vem tendo que dirimir conflitos.
Lula pediu para deixar Guido Mantega no Ministério da Fazenda, posto para o qual Dilma já havia escolhido nome de sua confiança e predileção, e Fernando Haddad, para quem o ex-presidente quis manter a vitrine da Educação para garantir chance de disputa eleitoral em 2012.
Plano, aliás, que não decola, a gestão do Ministério da Educação é uma sucessão de problemas.
Lula pediu, também, a manutenção de Nelson Jobim no Ministério da Defesa. Foi o apelo que Dilma recebeu pior, ela o identifica com adversários políticos, mas é, hoje, a autoridade que melhor atua politicamente para seu governo.
A última proeza de Jobim foi negociar, discretamente e com sucesso, entre o Executivo e o Legislativo, um dos impasses mais intrincados na sua área, a Comissão da Verdade.
A presidente não teve oportunidade de tomar conhecimento da desenvoltura do seu ministro.
(...)
O governo, no entanto, não dá respostas e não tem como:
está despreparado estrutural e funcionalmente.
Defenestrar só o ministro atingido não é garantia de que o governo sairá da paralisia e voltará a funcionar.
É necessário muito mais.
Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras