"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

agosto 16, 2012

Choque de realidade


O pacote de infraestrutura anunciado ontem pela presidente Dilma Rousseff recoloca o país numa rota da qual ele tinha sido desviado.

Ao longo dos últimos nove anos, as gestões petistas optaram por um caminho acidentado e cheio de buracos, um modelo depauperado que não chegou a lugar nenhum. Renderam-se agora, finalmente, às privatizações, alternativa que a oposição jamais deixou de defender.


A opção por privatizar 7,5 mil km de rodovias e 10 mil km de ferrovias atesta o fracasso do modelo aplicado pelo PT, que monopolizou no Estado a atribuição de fazer deslanchar a melhoria da infraestrutura do país.

A opção petista não deu certo; seu único resultado foi fazer o país perder anos patinando sem sair do lugar.


É possível fazer uma série de cálculos e usar exemplos de todos os tipos para ilustrar a paralisia a que o PT guiou a infraestrutura no Brasil. Mas, para simplificar, basta ater-se ao que vem ocorrendo sob o comando de Dilma.

Os investimentos do Dnit caíram 35% no primeiro semestre e os da Valec são hoje menos da metade do que eram dois anos atrás.
(Os dois órgãos, não custa lembrar, vinham funcionando como verdadeiros antros de falcatruas.)


Trata-se de uma espécie de custo PT:
a sobrecarga que o dogma ideológico - e eleitoralmente oportunista - do partido de Lula e Dilma impôs à sociedade brasileira em termos de ineficiência, desconforto e atrasos na nossa infraestrutura.

Com base nele, o país foi conduzido a um beco sem saída, do qual, agora, as privatizações vêm nos resgatar.


O PT até tentou improvisar, alegando que inventara, por exemplo, um novo jeito de cuidar das nossas rodovias sem que isso custasse muito aos usuários. Mas o modelo das concessões com pedágios a preço de banana, lançado por Lula em 2007, foi retumbante fiasco, como mostrou ontem a(Folha de S.Paulo,) e não freou a deterioração da nossa malha rodoviária.

Naquela ocasião, foram privatizados sete trechos, transferindo para concessionários a incumbência, entre outros, de investir R$ 1,2 bilhão (em valores atualizados) em duplicação e construção de novas estradas. As obras deveriam estar prontas em 2013, mas, passados quatro anos da assinatura dos contratos, cinco dos oito grandes projetos nem começaram e somente 10% dos investimentos previstos foram efetuados.

Com os aeroportos foi pior.
Depois de anos de caos aéreo, o governo do PT ainda demorou uma eternidade antes de curvar-se à alternativa das concessões, modelo testado e aprovado em todo o mundo. Só a ameaça de travar o país na Copa do Mundo, que ainda é real, fez a gestão Dilma repassar três terminais (Guarulhos, Brasília e Viracopos) à exploração privada neste ano.


Mas nada de obras, ainda.


A tardia conversão nos aeroportos deu-se à base de tanto improviso que, agora, teme-se que os novos concessionários, assim como ocorreu nas rodovias, não tenham condições de honrar os contratos. Afora isso, o modelo preservou a ineficiente Infraero com participação expressiva em todos os consórcios.

Sem falar que somente três aeroportos já foram concedidos - os das demais nove cidades-sede da Copa continuam aguardando.


Em relação às ferrovias, o novo modelo centraliza riscos na Valec - aquela do Doutor Juquinha... Uma melhor regulação poderia resultar no desejável aumento da nossa malha ferroviária, mas optou-se por um sistema em que a estatal leiloará direitos de passagem e assumirá, inclusive, a possibilidade de prejuízos em caso de baixa demanda.

Não parece eficiente, nem suficientemente simples, para expandir este modal tanto quanto um país continental como o Brasil necessita.


O governo promete tirar do papel R$ 133 bilhões - valor ainda modesto em percentual do PIB - em obras nos próximos 25 anos. Muitos dos empreendimentos agora colocados nas mãos da iniciativa privada gramaram anos nas planilhas e apresentações em powerpoint do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) sem sair do lugar.

É o caso do Ferroanel de São Paulo e das concessões das rodovias BR-040 e BR-116, por exemplo, previstas desde 2008, como mostra (
O Globo.)


Nas próximas semanas, o governo promete anunciar sua estratégia para os investimentos necessários à modernização e à ampliação de portos, aeroportos e hidrovias, que serão desatolados do PAC e repassados à iniciativa privada, incluindo também a possibilidade de parcerias público-privadas.

É esperar para ver.


Quando foi lançado como o primeiro candidato a presidente da República pelo PSDB, em 1988, Mario Covas propôs um "choque de capitalismo" para fazer o Brasil avançar. No governo Fernando Henrique, muito do que Covas defendeu foi feito, principalmente nas telecomunicações e na criação das agências reguladoras.

A tudo isso, o PT se opôs - no caso dos órgãos de regulação, foi além:
desmontou-os.


Foram necessários anos de equívocos para que o partido de Lula e Dilma revisasse suas posições. Não tem problema:
a conversão, ainda que tardia, ao modelo das privatizações é bem-vinda.
A população agradece se a atual gestão conseguir, pelo menos, honrar o que foi prometido ontem.


Será uma forma de compensar parte dos atrasos a que fomos submetidos pela teimosia do PT em não ver o óbvio e em insistir, por décadas, no que não dá certo.


Fonte: Instituto Teotônio Vilela
Choque de realidade

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